Texto regulamenta comércio dos dispositivos, proíbe uso em espaços fechados e cria mecanismos para reduzir atratividade para menores de 18 anos. Entidades médicas são contrárias à proposta.
A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado adiou nesta terça-feira (12) a votação da proposta que libera a venda de cigarros eletrônicos, os “vapes”, no Brasil e proíbe o consumo e a comercialização para menores de idade.
A análise da proposta foi interrompida após a aprovação de um pedido de audiência pública para debate sobre o parecer do relator, Eduardo Gomes (PL-TO).
A audiência deverá ser realizada em conjunto com as comissões de Fiscalização e Controle, e de Assuntos Sociais, por onde o projeto, se aprovado pela CAE, ainda precisará passar antes de ser enviado à Câmara dos Deputados.
O texto, de autoria da senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), tem sofrido resistências entre parlamentares conservadores, que têm feito oposição e participado de uma campanha, nos corredores da Casa, para barrar o avanço da proposta.
O projeto autoriza, mediante registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a produção, o consumo, a venda e a exportação e importação de dispositivos eletrônicos para fumar — com ou sem nicotina e tabaco.
Entre outros pontos, a proposta proíbe o uso em espaços fechados, como já ocorre com os cigarros tradicionais.
O comércio de cigarros eletrônicos é proibido no país desde 2009, em razão de uma resolução da Anvisa. À época, a agência decidiu pela proibição da venda, da importação e da propaganda dos dispositivos por conta da ausência de dados científicos a respeito da segurança dos produtos.
Em 2022, a proibição foi mantida, mas a decisão poderá ser revista em nova análise da diretoria colegiada da Anvisa prevista para este ano.
Redução de ‘danos’
Relator do texto, o senador Eduardo Gomes declarou ao g1 que o projeto poderá “reduzir danos” do mercado desenfreado de cigarros eletrônicos.
Gomes, que alega ser “pessoalmente contra o uso” dos dispositivos, afirmou que a proposta vai regular os produtos e abrir caminho para eventuais punições.
O relator também afirma que a regulamentação pode levar a um aumento de vagas no mercado de trabalho e de R$ 673 milhões na arrecadação com tributos.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), afirmou que o Planalto ainda não encaminhou posicionamento a respeito do andamento da proposta na Casa.
Para a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), a proposta serve como um “freio” para a venda de produtos a menores e para o avanço de organizações criminosas sobre o comércio dos dispositivos.
Senado contra a proposta em análise na CAE — Foto: Kevin Lima/g1
Associações médicas são contra liberação
Em manifestações públicas, associações médicas apontam risco à saúde humana e defendem a continuidade da proibição.
Levantamento do Ipec aponta que, mesmo com a proibição de venda, 2,9 milhões de brasileiros utilizavam cigarros eletrônicos em 2023.
O número desconsidera menores de idade, que, segundo especialistas em medicina, têm se tornado grande parcela de usuários do produto.
Entidades de saúde têm feito campanha junto a parlamentares para barrar o avanço da proposta. O argumento é que estudos científicos apontam malefícios, como inflamações pulmonares perigosas e câncer de pulmão.
As associações mencionam ainda a crescente de casos de EVALI, uma sigla em inglês que significa lesão pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico.
O que diz a proposta
O projeto prevê que, para conseguir produzir e distribuir o produto no mercado nacional, a empresa fabricante precisará submeter um pedido de registro à Anvisa, que levará em conta no processo, entre outros pontos, um laudo de avaliação toxicológica — ou seja, um estudo do prejuízo do produto para a saúde humana.
Pela proposta, a Anvisa poderá realizar inspeções para avaliar etapas da produção dos produtos.
Também segundo o projeto:
- As empresas que conquistarem autorização para a venda terão de arcar com uma taxa anual de R$ 100 mil
- A Taxa de Fiscalização de Vigilância Sanitária (TFVS) será cobrada por registro e por renovação.
- Será proibida a comercialização de cigarros eletrônicos com vitaminas, chamados de “health vapes” ou “vape de vitaminas”; cafeína; e aditivos que causem problemas à saúde humana
- Será vedada a publicidade dos produtos em veículos de comunicação e redes sociais, assim como os cigarros tradicionais. A exposição das mercadorias poderá ocorrer somente no interior das lojas, e a venda será condicionada à maioridade
- As embalagens dos produtos também deverão seguir regras. Não poderão, por exemplo, fazer insinuações de que o uso do cigarro eletrônico aumenta a virilidade ou potencializa experiências sexuais
- Serão proibidas associações dos produtos ao universo infantojuvenil, como desenhos ou com a utilização de referências a sobremesas ou doces
- O descumprimento das regras será considerado infração sanitária, podendo ser punido com multa, suspensão de vendas, interdição de estabelecimentos, entre outros
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Entenda o projeto em análise no Senado que libera venda de cigarros eletrônicos no país
Crianças e monitoramento
O texto estabelece punições para qualquer pessoa ou empresa que fornecer ou oferecer cigarros eletrônicos a menores de idade.
Quem desrespeitar a regra conscientemente poderá pagar multa entre R$ 20 mil e R$ 10 milhões. Também responderá criminalmente, com possibilidade de ser punido a até oito anos de prisão.
A proposta também determina:
- a criação, por parte das empresas, de um sistema de monitoramento de problemas de saúde supostamente ocasionados pelo uso dos produtos
- o desenvolvimento pelas empresas de um canal de atendimento ao consumidor, com funcionamento em tempo integral
- a disponibilização pela Anvisa de canal para que usuários notifiquem supostos problemas de saúde ocasionados pelo uso dos produtos
- Um outro espaço de comunicação deverá ser criado para que órgãos de vigilância sanitária e para a rede credenciada do Sistema Único de Saúde (SUS) comuniquem eventos de saúde graves que envolvam o uso de cigarros eletrônicos
Cigarro eletrônico — Foto: Banco de imagens – freepik
Debate na Anvisa
A Anvisa deve voltar a discutir a comercialização dos cigarros eletrônicos ainda este ano. O debate será feito em cima de uma consulta pública, já encerrada, promovida pela agência em 2023.
As milhares de contribuições apresentadas à Anvisa serão consideradas em um relatório, que pode recomendar a manutenção da proibição ou a liberação de comércio dos dispositivos. A análise será feita pela Diretoria Colegiada da agência.
A proibição de venda dos cigarros eletrônicos está em vigor desde 2009. Em 2022, ao analisar um relatório técnico a respeito dos impactos à saúde e da toxicidade dos produtos, a agência decidiu manter a medida.
Assim como em 2009, o parecer da agência apontou que não há comprovação científica da segurança desses dispositivos para a saúde humana.
Publicado no Jornal Da Globo.